top of page

A PHDA nos relacionamentos: uma dança dessincronizada?

  • anateixeirapsicolo
  • 15 de mai.
  • 4 min de leitura

A Perturbação de Hiperatividade e Défice de Atenção (PHDA) é uma condição do neurodesenvolvimento caracterizada por sintomas persistentes de desatenção, impulsividade e, frequentemente, hiperatividade, que se manifestam de forma desadaptativa em diversos contextos. Esta condição compromete de forma significativa o funcionamento global do indivíduo, interferindo no desempenho académico e profissional, bem como nas relações interpessoais. A etiologia da PHDA está associada a alterações nos circuitos neurobiológicos responsáveis pela autorregulação do comportamento e das emoções, com particular destaque para disfunções nos sistemas dopaminérgico e noradrenérgico.


Os sintomas da PHDA podem variar de pessoa para pessoa, mas geralmente incluem:

Défice de atenção – que se manifesta pela dificuldade em manter o foco em tarefas prolongadas, esquecimentos frequentes, distração fácil e dificuldade em seguir instruções detalhadas.

Impulsividade – dificuldade em inibir respostas imediatas, tendência a interromper conversações do outro, dificuldades em esperar pela sua vez e tomar decisões precipitadas sem considerar consequências.

Hiperatividade – necessidade constante de movimento, inquietação, dificuldade em permanecer sentado por longos períodos e tendência a falar excessivamente. Frequentemente, existe o sensação de estar “ligado à corrente”.


Dinâmicas relacionais e impactos da PHDA

Num relacionamento, quando um dos parceiros tem PHDA a dinâmica do casal pode ser afetada. As dificuldades mais comuns incluem:

  • Desorganização e falta de atenção – O parceiro com PHDA pode ter dificuldades em manter compromissos, organizar tarefas domésticas ou recordar datas importantes, o que pode ser interpretado como falta de empenho na relação.

  • Impulsividade e dificuldades na gestão emocional – Explosões emocionais, dificuldade em lidar com frustrações e respostas impulsivas podem levar a conflitos frequentes e dificultar uma comunicação aberta.

  • Desigualdade na distribuição de responsabilidades – Por vezes, o/a parceiro/a sem PHDA pode assumir um papel de “cuidador”, acumulando responsabilidades, o que pode gerar ressentimento e exaustão emocional.

  • Hiperfoco – Embora a PHDA envolva características clínicas associadas ao défice de atenção, pode também resultar em períodos de hiperfoco, onde a pessoa se concentra intensamente num interesse específico, negligenciando outras áreas, incluindo rituais da relação. Tal poderá promover um sentimento de solidão na relação.


Tais desafios poderão comprometer a intimidade emocional do casal. A pessoa com PHDA também enfrenta dificuldades e emoções intensas dentro da relação, particularmente o sentimento de culpa por não conseguir corresponder às expectativas do parceiro e da relação. A frustração emerge, assim como a sensação de ser mal compreendido ou de que o parceiro não reconhece os seus esforços, o que fragiliza a autoestima e o sentimento de pertença na relação.


Por outro lado, o/a parceiro/a sem PHDA pode igualmente vivenciar um desgaste emocional significativo, por sentir que precisa de assumir responsabilidades adicionais, manter uma vigilância constante ou gerir frequentemente a imprevisibilidade do outro. A repetição de padrões de desorganização, impulsividade ou esquecimento pode gerar frustração acumulada, sensação de negligência emocional e, por vezes, dúvidas quanto ao compromisso ou envolvimento afetivo do parceiro com PHDA. Estes sentimentos, quando não reconhecidos ou comunicados de forma adequada, podem levar ao distanciamento emocional e ao reforço de dinâmicas disfuncionais na relação.


Uma dança descompassada

A dinâmica de um casal onde um dos parceiros tem PHDA pode ser comparada a uma dança onde os ritmos são diferentes. Enquanto um parceiro tenta seguir um compasso regular e previsível, o outro muda o ritmo inesperadamente, acelerando, desacelerando ou até esquecendo os passos. Essa descoordenação pode gerar frustração, incompreensão e desgaste emocional, tanto para a pessoa com PHDA como para o seu parceiro. Contudo, com o desenvolvimento de competências relacionais – como a comunicação empática, a flexibilidade na gestão de expectativas e a implementação de estratégias de adaptação mútua – é possível promover uma co-regulação eficaz. O casal pode aprender a criar uma coreografia única, que integra as especificidades de ambos os parceiros, reforçando a resiliência e a intimidade do vínculo conjugal.


É essencial que o/a parceiro/a sem PHDA compreenda que os comportamentos do outro não são resultado de desinteresse ou falta de amor, mas sim manifestações da condição. A empatia e a aceitação são fundamentais para evitar ressentimentos e interpretações negativas. É igualmente importante que o/a parceiro/a com PHDA reconheça o impacto dos seus comportamentos na relação e assuma um papel ativo na gestão dos mesmos. Tal implica o compromisso com estratégias de autorregulação, o investimento na comunicação aberta e responsável, assim como procurar suporte profissional em situações de maior dificuldade emocional.


Além disso, é importante que ambos reconheçam que a PHDA não define o relacionamento e que, com ajustes e estratégias adequadas, é possível desenvolver uma relação equilibrada e satisfatória para ambos.


Estratégias para uma dança mais sincronizada:

1) Comunicação clara – Evitar ambiguidades e estabelecer canais de comunicação abertos e eficazes, como listas de tarefas, lembretes e encontros periódicos para alinhar expectativas e compromissos.

2) Definição de papéis e responsabilidades – Acordar uma distribuição justa das tarefas domésticas e das responsabilidades diárias, de modo a evitar frustrações e sobrecarga para um dos parceiros.

3) Uso de ferramentas de organização – Aplicações, agendas e alarmes podem ajudar na gestão do tempo e das obrigações, reduzindo esquecimentos e desorganização.

4) Gestão de conflitos – Técnicas de regulação emocional e estratégias de resolução de problemas são fundamentais para evitar discussões impulsivas e manter um ambiente de respeito mútuo. A técnica do Time Out (“Tempo de Pausa”) pode ser útil:

a) Consiste em interromper a discussão quando um ou ambos os parceiros identificam sinais de escalada emocional (ex. aumento do tom de voz, sensação de perda de controlo). A pausa deve ser acordada previamente, com a garantia de que a conversa será retomada num período definido (ex. após 30 minutos), quando ambos estiverem mais regulados emocionalmente. Durante esse intervalo, é recomendável que cada um utilize estratégias individuais de autorregulação (ex. respiração profunda, caminhada breve, ouvir música, tomar um banho).

5) Desenvolver tolerância e o reforço positivo – Em vez de enfatizar as falhas e as dificuldades, é essencial reconhecer os esforços e progressos do/a parceiro/a com PHDA, promovendo um ambiente de apoio e incentivo.

6) Terapia de casal e apoio profissional – Acompanhamento psicológico ou terapia de casal pode ajudar a melhorar a comunicação, desenvolver estratégias eficazes e fortalecer a relação.


A PHDA pode trazer desafios à conjugalidade, mas não precisa ser um obstáculo para uma relação satisfatória. Compreensão, estratégias adaptativas e colaboração mútua são essenciais para construir um relacionamento baseado no respeito, no apoio e na aceitação – e numa dança mais sincronizada, cheia de ritmo e vitalidade.

 
 
 

Posts recentes

Ver tudo
bottom of page